(sindicato dos inspetores do SEF)

O “cavalo de Tróia” da fusão das polícias

2020-06-13 09:48:51

O interesse nacional e da União Europeia obriga a denunciar a operação que está em marcha para fragilizar as bases de dados policiais e, em particular, as do Serviço de Estrangeiro e Fronteiras (SEF), as quais representam mais de 60% dos recursos digitais do Ministério da Administração Interna.

Por detrás das justificações técnicas, a questão de sempre é a obscura vontade de fundir todas as polícias numa só! Essa obsessão centralista é errada: juntar forças ou serviços de segurança ágeis, modernos e tecnológicos como o SEF, a contingentes enormes como a PSP ou a GNR que são pesados, burocráticos e servidos por uma péssima informática, prejudicaria toda a gente. A PSP e a GNR são grandes de mais para mudar a essência dos seus arcaísmos. E as virtudes do SEF seriam de imediato diluídas na mistura de dois enormes caldeirões.

Antero Luís, secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna, que fez uma parte da vida como juiz e outra parte no SIS, é um ativista da fusão. Só que, como não tem peso político para a defender publicamente, tenta construí-la subrepticiamente através da concentração das bases de dados de todas as polícias, juntando, não só todos os servidores num mesmo local (no Tagus Park) e todas as redundâncias numa mesma base (Contumil), mas também as bases de dados do SEF, da GNR e da PSP nos mesmos servidores, dando acesso a informação crítica a entidades sem competência para tal e fragilizando as três forças envolvidas nesta Rede Nacional de Segurança Interna (RNSI).

Este é o primeiro passo para uma futura fusão das polícias, no qual a partilha dos servidores e da sua gestão é o cavalo de Tróia desta estratégia executada por um Ulisses improvável como Antero Luís. O centralismo é uma doença do Estado português. O curioso é que o ministro Eduardo Cabrita sabe isso, razão pela qual liderou a descentralização de competências do Estado central para os municípios. Agora parece não estar a ver o filme...

A razão principal deste alerta prende-se, porém, com segurança. Só maneja com segurança bases de dados quem tem competências e vocação para isso. Para além da carreira de Investigação e Fiscalização (os inspetores) e da carreira Administrativa, o SEF tem também uma carreira específica de Informática: quem trata os dados dos cidadãos nacionais e estrangeiros que constam dos sistemas de informação do SEF, são servidores públicos altamente preparados, credenciados e qualificados, alguns deles com mais de 20 anos a gerir sistemas altamente complexos. É por essa razão que em Portugal o gestor nacional do Sistema de Informações Schengen é o SEF.

A fusão dos servidores faria com que a gestão dos sistemas que albergam esta informação sensível passasse a ser feita por privados, modo habitual de agir da RNSI, que é uma entidade administrativa sem competência nem valências próprias para garantir uma função tão delicada. Isto significaria entregar informação classificada da União Europeia a empresas externas.

Não faz o menor sentido, é uma inconsciência. As regras europeias obrigam a que, se os sistemas nacionais forem abaixo durante mais de seis horas, os países tenham de acionar de imediato o protocolo de reposição de fronteiras. Havia de ser bonito...

 

Acácio Pereira, Presidente do Sindicato da Carreira de Investigação e Fiscalização do SEF

Artigo de Opinião in Expresso